Edição nº 117
              
              O caminho do tiro com o arco  |  Tiros certeiros
            



              
              
              
              
              
              
              
              A  importância de repetir a mesma coisa
                   Uma  ação é um pensamento que se manifesta. 
                                 Um  pequeno gesto nos denuncia, de modo que temos que aperfeiçoar  tudo, pensar nos detalhes, aprender a técnica de tal maneira  que ela se torne intuitiva. Intuição nada tem a ver com  rotina, mas com um estado de espírito que está além  da técnica. 
                    Assim,  depois de muito praticar,  já não pensamos em todos os  movimentos necessários: eles passam a fazer parte da nossa  própria existência. Mas para isso, é preciso  treinar e repetir. 
                    E  como se não bastasse, é preciso repetir e treinar. 
                    Observe  um bom ferreiro trabalhando o aço. Para o olhar destreinado,   ele está repetindo as mesmas marteladas.
                    Mas  quem conhece a importância do treinamento, sabe que cada vez  que ele levanta o martelo e o faz descer, a intensidade do golpe é  diferente. A mão repete o mesmo gesto, mas à medida que  se aproxima do ferro, ela compreende que se deve tocá-lo com   mais dureza ou mais suavidade. 
                    Observe  o moinho. Para quem olha suas pás apenas uma vez, ele parece  girar com a mesma velocidade,  repetindo sempre o mesmo movimento. 
                    Mas  aquele que conhece os moinhos sabe que eles estão  condicionados ao vento, e mudam de direção sempre que  for necessário. 
                    A  mão do ferreiro foi educada depois que ele repetiu milhares de  vezes o gesto de martelar. As pás do moinho são capazes  de se moverem com velocidade depois que o vento soprou muito, e fez  com que suas engrenagens ficassem polidas. 
                    O  arqueiro permite que muitas flechas passem longe do seu objetivo,  porque sabe que só irá aprender a importância do  arco, da postura, da corda, e do alvo, depois que repetir seus gestos  milhares de vezes, sem medo de errar. 
                    Até  que chega o momento em que não é mais preciso pensar no  que se está fazendo. A partir daí, o arqueiro passa a  ser seu arco, sua flecha, e seu alvo.
Como observar o vôo da flecha 
                               A  flecha é a intenção que se projeta no espaço. 
                    Uma  vez que foi disparada, já não há mais nada que o  arqueiro possa fazer, a não ser acompanhar o seu percurso em  direção ao alvo. A partir desse momento, a tensão  necessária para o tiro já não tem mais razão  para existir. 
                    Portanto,  o arqueiro mantém os olhos fixos no vôo da flecha, mas  seu coração repousa, e ele sorri. 
                    Nesse  momento, se treinou o bastante, se conseguiu desenvolver seu  instinto, se manteve a elegância e a concentração  durante todo o processo do disparo, ele sentirá a presença  do universo, e verá que sua ação foi justa e  merecida. 
                    A  técnica faz com que as duas mãos estejam prontas, que a  respiração seja precisa, e que os olhos possam fixar o  alvo. O instinto faz com que  o momento do disparo seja perfeito. 
                    Quem  passar por perto e ver o arqueiro de braços abertos, com os  olhos acompanhando a flecha, irá achar que está parado.  Mas os  aliados sabem que a mente de quem fez o disparo mudou de  dimensão, está agora em contacto com todo o universo:   ela continua trabalhando, aprendendo tudo o que aquele disparo trouxe  de positivo, corrigindo os eventuais erros, aceitando suas  qualidades, esperando para ver como o alvo reage ao ser atingido. 
                    Quando  o arqueiro estica a corda, pode ver o mundo inteiro dentro do seu  arco. Quando acompanha o vôo da flecha, este mundo se aproxima  dele, o acaricia, e faz com que tenha a sensação  perfeita do dever cumprido. 
                    Um  guerreiro da luz, depois que cumpre seu dever e transforma sua  intenção em gesto, não precisa temer mais nada:  ele fez o que devia. Não se deixou paralisar pelo medo  –  mesmo que a flecha não atinja o alvo, ele terá outra  oportunidade, porque não foi covarde.
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