Edição nº 175

Para visitar o blog de Paulo Coelho (atualizado diariamente), clique aqui.

Estou lançando um novo projeto: um filme experimental, feito por leitores, baseado no meu novo livro "A Bruxa de Portobello". Todos estão convidados a participar. Sugiro também que convidem seus amigos para visitar o link "A Bruxa Experimental ". No Brasil uma das parcerias é com a Globo.com, e para acessar o link, clique aqui.

As duas gotas de óleo


As duas gotas de óleo

No alto da pequena cidade de Tarifa existe um velho forte construído pelos mouros. Lembro-me de ter sentado ali com minha mulher, Christina, em 1982, olhando pela primeira vez um continente do outro lado do estreito: a África. Naquele momento, não podia sonhar que este momento de preguiça no final de uma tarde iria inspirar uma cena no meu livro mais famoso, “O Alquimista.” Tampouco podia sonhar que a história a seguir, escutada no carro, serviria como um excelente exemplo para todos nós que estamos em busca do equilíbrio entre o rigor e a compaixão.

Certo mercador enviou seu filho para aprender o Segredo da Felicidade com o mais sábio de todos os homens. O rapaz andou durante quarenta dias pelo deserto, até chegar a um belo castelo, no alto de uma montanha. Lá vivia o Sábio que o rapaz buscava.

Ao invés de encontrar um homem santo, porém, o nosso herói entrou numa sala e viu uma atividade imensa; mercadores entravam e saíam, pessoas conversavam pelos cantos, uma pequena orquestra tocava melodias suaves, e havia uma farta mesa com os mais deliciosos pratos daquela região do mundo.

O Sábio conversava com todos, e o rapaz teve que esperar duas horas até chegar sua vez de ser atendido.

Com muita paciência, escutou atentamente o motivo da visita do rapaz, mas disse-lhe que naquele momento não tinha tempo de explicar-lhe o Segredo da Felicidade.

Sugeriu que o rapaz desse um passeio por seu palácio, e voltasse daqui a duas horas.

– Entretanto, quero lhe pedir um favor – completou, entregando ao rapaz uma colher de chá, onde pingou duas gotas de óleo. – Enquanto você estiver caminhando, carregue esta colher sem deixar que o óleo seja derramado.

O rapaz começou a subir e descer as escadarias do palácio, mantendo sempre os olhos fixos na colher. Ao final de duas horas, retornou à presença do Sábio.

– Então – perguntou o Sábio – você viu as tapeçarias da Pérsia que estão na minha sala de jantar? Viu o jardim que o Mestre dos Jardineiros demorou dez anos para criar? Reparou nos belos pergaminhos de minha biblioteca?

O rapaz, envergonhado, confessou que não havia visto nada. Sua única preocupação era não derramar as gotas de óleo que o Sábio lhe havia confiado.

– Pois então volte e conheça as maravilhas do meu mundo – disse o Sábio. – Você não pode confiar num homem se não conhece sua casa.

Já mais tranqüilo, o rapaz pegou a colher e voltou a passear pelo palácio, desta vez reparando em todas as obras de arte que pendiam do teto e das paredes. Viu os jardins, as montanhas ao redor, a delicadeza das flores, o requinte com que cada obra de arte estava colocada em seu lugar. De volta à presença do Sábio, relatou pormenorizadamente tudo que havia visto.

– Mas onde estão as duas gotas de óleo que lhe confiei? – perguntou o Sábio.

Olhando para a colher, o rapaz percebeu que as havia derramado.

– Pois este é o único conselho que eu tenho para lhe dar – disse o mais Sábio dos Sábios. – O segredo da felicidade está em olhar todas as maravilhas do mundo, e nunca se esquecer das duas gotas de óleo na colher.

 
Edição nº 175
Agenda: se você deseja saber onde Paulo Coelho estará este mês clique aqui.